Deve haver introduções melhores
Recomendo
O livro não pretende ser mais que algo duplamente sintético — uma introdução, e uma introdução breve. Apesar disso, seu poder introdutório é um tanto limitado. O texto é composto de aulas ministradas pelo autor, e uma primeira perda se dá aí: as palestras podiam ser acompanhadas pela projeção de imagens e por alguns esquemas na lousa, mas tudo isso fica com espaço minguado, no livro. As ilustrações são em preto-e-branco e muitas são pequenas; é verdade que não se poderia esperar outra coisa, num livro simples de bolso, mas são notavelmente inúteis inclusões como a do "Juízo Final" de Michelangelo, cujos detalhes ficam completamente perdidos e mesmo as figuras humanas são difíceis de apreender. Dois ou três capítulos versam sobre o que é a Bíblia e como foi montada, sendo que papel demais é gasto com a apresentação de "leituras" da Bíblia ao longo da história, escolhidas aliás de um modo esquisito: o autor não fornece diretamente as informações básicas e mal dá atenção à leitura da igreja católica, seu desenvolvimento, a cultura medieval acerca do texto bíblico... em contrapartida, multiplicam-se as páginas a respeito daquelas interpretações "contra a ordem estabelecida". É como se tivéssemos mais e mais suco gástrico, mas o autor se houvesse esquecido de oferecer o alimento a ser corroído pela crítica. O livro às vezes soa como um documentário televisivo, em que frequentemente o desviante ou "outré" é mais explorado do que o rotineiro. Também vai ficando clara uma tendência uma predileção do autor, que tendo a chamar "diversitária". Grupos que visam a transformar a Bíblia e o mundo, propostas de renovação das instituições, tudo isso ganha destaque; a "diversidade de leituras" é quase um lema da conclusão do livro, especialmente enaltecidas as interpretações com certo cunho politizado e com aquele "apelo para o social" que está tão em alta. Nenhuma palavra, porém, sobre anticristianismo; sobre satanismo; sobre ateísmo. Nada de mencionar profanação de Bíblias e outros objetos de culto para cristãos ou judeus. Ficamos com a (errônea) impressão de que, depois da Bíblia, há só as leituras antiquadas, fedidas de naftalina, e aquelas modernosas, chiques e "prafrentex", que ganham a maior parte dos pontos, agregam o maior número de excluídos, e assim por diante. Quase não há mal apresentado pelo nosso livro que não tenha um pé na "aprorpiação maléfica" do texto bíblico exercida indevidamente pelos representantes do "passado". Do ponto de vista textual, a versão brasileira está boa, com um ou outro errinhos de revisão; valeria mais estrelas. O que prejudica essa introdução, algo até mais decisivo do que os apontamentos que já trouxe, é seu caráter pouco estruturante. Não quer dizer que o livro seja desorganizado — os capítulos tratam do que anunciam: Bíblia e política, Bíblia e cultura, Bíblia na América Latina, na África, no mundo dos fiéis, no mundo dos críticos etc. — mas há vazios que obstam a uma verdadeira visão inicial do campo, tarefa fundamental de uma introdução. O opúsculo simplesmente nãos serve para que o leitor esboce a estrutura dum "repertório da sua ignorância" em matéria de Bíblia, ou seja, para que tenha noção fiel do quanto ainda não sabe e que pode aprender. Esquematizar os saberes faltantes num possível plano de estudos também é difícil de fazer a partir da "Introdução" de Riches. Concluindo: há lacunas, há saltos, e há essa distribuição duvidosa no peso dos assuntos. Os capítulos são todos praticamente do mesmo tamanho, mas o resultado não deixa de ser estranhamente desproporcional. É claro que há as páginas de que gostei, como as que tratam das "Paixões" de Bach e as que esquematizam as fontes de composição do Pentateuco; outros dados históricos também valem a pena. O conjunto, porém, mereceria uma nota entre 6 e 7, o que me leva a dar três estrelas ao livro.
T.
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