Meu Dickens Favorito
Recomendo
Primeiro, devo esclarecer que minhas versões dessa obra são, para o Kindle, “Bleak House” em “Delphi Complete Works of Charles Dickens” e, em papel, “A Casa Soturna”, edição da Nova Fronteira de 1986. Considerada por muitos como a obra mais complexa de Dickens, esse é, realmente, um romance com várias camadas – tanto estruturais quanto de significado. A quantidade de personagens é enorme, contudo, sua construção é primorosa. Mesmo entre as personagens secundárias encontramos várias “maravilhas”. As narrativas, tanto das personagens primárias quanto das secundárias, frequentemente se cruzam ou entrelaçam, tendo como espinha dorsal uma disputa judicial: “Jarndyce e Jarndyce” – um grande caso de herança milionária envolvendo vários testamentos, cada qual com beneficiários distintos. Cabe a Justiça definir qual testamento é válido e quem é o real beneficiário dessa fortuna. O problema é que essa disputa vem se arrastando por décadas, passando, de geração a geração, a “maldição” da ilusão de riqueza tão próxima e o desespero de não conseguir alcança-la. Outro detalhe muito interessante é que há dois níveis de narração. Coexistem, de maneira harmoniosa, o narrador onisciente e uma narradora em primeira pessoa, Esther (lançada cega em uma trama na qual ela já tinha, desde sua concepção, papel vital). Vários temas são discutidos nessa obra, sendo o principal, obviamente, a inépcia da Justiça – o caráter absurdo de um sistema judicial que pouco se alinha com a justiça de fato (que surge como um maquinário institucional que parece existir apenas para a satisfação de suas próprias necessidades, como uma cobra a engolir sua própria cauda). A injustiça social, levando parte da população a viver em condições de absoluta miséria e desamparo (em especial as crianças). A condição de vulnerabilidade feminina – em um mundo regido pelo dinheiro e pela vontade masculina –, tornando o casamento um instituto perverso (como no caso de Honoria). A hipocrisia social (ou total falta de discernimento, depende da interpretação), seja no parasitismo explícito (Skimpole) ou na beneficência questionável (Sra. Jellyby). Enfim, há uma quantidade enorme de questões abordadas (nem é possível descrevê-las todas aqui), tanto objetivas quanto subjetivas. Ah, e ainda há uma personagem que morre de “combustão humana espontânea”! Ãh???!!!! Delicioso!!! Na minha opinião, é uma obra magnífica!!! Certamente recomendo. Quanto a adaptações: 1959: minissérie da BBC. Só descobri hoje que essa produção está disponível em dvd desde o final de 2017. Faz parte de um coleção chamada “Charles Dickens Classics”, que traz várias adaptações de Dickens feitas pela BBC nas décadas de 50 e 60. Vou encomendá-la na Amazon UK. 1985: minissérie da BBC. Muita gente considera arrastada, com certas falhas de direção. Mas eu gosto muito. Há algumas interpretações excelentes, com destaque para Suzanne Burden, como Esther Summerson; Diana Rigg, como Lady Dedlock e T. P. McKenna, como Harold Skimpole. 2005: minissérie da BBC. Um elenco tão maravilhoso!!! É até difícil citar alguns destaques, pois todos os atores estão muito bem. Adoro Anna Maxwell Martin, como Esther Summerson; Gillian Anderson, como Lady Dedlock; Charles Dance, como Mr. Tulkinghorn; Phil Davis, como Smallweed (ugh!)… Maravilhoso!!!
C.C.
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