Muitos tipos de culpa
Recomendo
"A Questão da Culpa", de Karl Jaspers. Jaspers foi um psiquiatra e filósofo alemão do século XX, falecido em 1969. Publicado em 1946, quando ainda nem existia governo alemão e alguns dos crimes mais horríveis dos nazistas haviam se tornado conhecidos do grande público, "A Questão da Culpa" analisa como se deveria enfrentar a questão da culpa atribuída ao povo alemão pelas desgraças nazistas. Jaspers faz uma análise sistemática dos diferentes aspectos dessa culpa, identificando as culpas criminal, política, moral e a mais vaporosa de todas, a culpa metafísica. Discorre sobre as consequências de cada uma delas, as instâncias nas quais elas deveriam ser julgadas, e seus respectivos meios de purificação. A análise toda é, evidentemente, de um caso particular, a Alemanha ao final da II Guerra, mas o tratamento dado por Jaspers ao assunto faz que o livro seja aplicável a qualquer comunidade que tenha em seu passado explorado alguma outra ou cujo governo tenha cometido alguma atrocidade, ou seja, todo mundo. Mais importante ainda é a insistência de Jaspers na coragem de tentar entender o outro e o que ele pensa e quer, ao invés de demonizar as diferenças e tirar a individualidade das pessoas ao agrupá-las em algum "ismo" qualquer de "inimigos". E aqui vale a pena citar Jaspers um pouco mais: "Acolher o que é comum no contraditório é mais importante do que o estabelecimento prematuro de pontos de vista exclusivos, com os quais se encerra a conversa pela ausência de perspectivas de sucesso. É tão fácil defender juízos firmes carregando nas emoções; é difícil elaborar de forma serena. É fácil interromper a comunicação com afirmações bruscas; é difícil penetrar incessantemente no fundo da verdade, para além das afirmações. É fácil adotar uma opinião e mantê-la para poupar-se o trabalho de continuar pensando; é difícil avançar passo a passo e não impedir mais questionamentos." O livro é curto, é farto em ideias, e tem uma linguagem lúcida e clara, o que é extraordinário, considerando ter sido escrito por um filósofo alemão. Livro excelente. Li duas vezes, e prevejo que acontecerá novamente.
Sergio
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