O coração das trevas de Leopoldo II
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Vaidoso e, demasiadamente dissimulado, Leopoldo II queria um império ultramarino para chamar de seu. A Bélgica estava comprimida entre três potências da Revolução Industrial, ou seja, Inglaterra, França e a Alemanha depois da unificação impetrada por Bismark em 1871. Inglaterra e França eram potências imperiais. A Alemanha galgava possessões na Namíbia, África [ outro horrendo genocídio entre 1904-1908 em que os alemães também devem prestar contas a humanidade] Curiosamente, estas três potências seriam protagonistas no hecatombe humanitário da I Guerra (1914-1918). As sementes que gestaram a morte nas trincheiras, foram urdidas, em boa medida, pela crueldade imperialista no Continente Africano. Mas qual era a relevância da Bélgica neste contexto geopolítico? Um país sem relevância e sem notabilidade. Enquanto as grandes potências na Europa cingiam seu poder bélico, cultural e industrial, a Bélgica era um pedacinho de mundo sem atrativos: O próprio Leopoldo II tinha uma visão preconceituosa sobre o país que governava: […] “País pequeno, gente pequena”, resmungava Leopoldo sobre a Bélgica . O próprio Leopoldo, pai do Leopoldo II, tentou comprar terras na América do Sul, Creta, Cuba e até o Texas antes de fazer parte dos EUA como mimo Imperial. Entretanto, se nenhum destes países falam neerlandês, francês e alemão, isto nos diz que a competência de convencimento de Leopoldo para tais transações não eram convincentes. Depois de seu pai, o jovem Leopoldo II, acalentava devaneios sobre adquirir qualquer coisa na Abissínia ou no Nilo. “Talvez os argentinos pudessem lhe arranjar alguma coisa... Quem sabe poderia afanar um naco da China? De Fiji? Do Vietnã? Das Filipinas? Uma ilha na costa do Uruguai? Ou no Pacífico?” O que transformou essa trama secundária da história dinástica europeia numa tragédia mundial foi a penetração da África Central. Leopoldo II queria, como disse, uma fatia “deste magnífico bolo africano “,e, para tanto, difundiu uma arguciosa campanha de filantropia. Enquanto outras potências coloniais não queriam adentrarem para os desafios tropicais do Congo, Leopoldo II, vestindo seu manto de hipocrisia propôs “levar a civilização para a África” (palavras ditas a Rainha Vitória), para aquele território, notadamente, hostil. Muitos missionários e exploradores europeus já haviam advertido sobre os desafios da África Central. Traficantes muçulmanos de escravos abasteciam-se, havia muito tempo, nos reinos africanos, e quando o movimento antiescravista pôs fim ao envolvimento britânico no tráfico atlântico o combate à escravidão africana tornou-se causa moral de grande prestígio entre os monarcas e estadistas europeus. De tal modo, em 1876 realizou-se uma grande conferência na Bélgica, na qual exploradores, políticos e benfeitores de toda a Europa e da Rússia foram homenageados, condecorados, ouvidos e recebidos com magníficos banquetes. Bebida de graça, luxo e adulação pode arrebatar corações e podem ser sobejos instrumentos de convencimento . Leopoldo II propôs entre brindes ser a o farol norteador rumo ao progresso contemplando milhões de nativos com uma rede de “estações europeias no Congo, onde médicos, cientistas e outros ajudassem a abolir a escravidão, estabelecer a “harmonia entre os chefes” e “pacificar” a região. Formaram para tanto “Associação Internacional para a África”. Leopoldo II queria uma fatia do “bolo africano” e lhe foi concedido A historiografia comenta as investidas de Leopoldo II : [...] "Comerciantes armados precipitaram-se para dentro da barriga da África, de início comprando todo o marfim disponível. Chefes eram induzidos, com falsos argumentos, a transferir suas terras, aldeões eram seduzidos, intimidados e ameaçados para que entregassem seus estoques de alimentos e marfim. Elefantes foram caçados e quase extintos em todas as áreas aonde os brancos conseguiam chegar. A lei da forca e do açoite entrou fundo no Congo; a cruzada supostamente humanitária tornou-se uma nova forma de escravidão A lei da forca e do açoite entrou fundo no Congo; a cruzada supostamente humanitária tornou-se uma nova forma de escravidão. O marfim tinha enorme valor, pois era usado em quase tudo, desde dentes falsos a teclas de piano, mas, quando o pneu inflável para bicicletas foi inventado, a borracha” Tamanho morticínio e exploração não ficaria oculto em uma época em que as tecnologias da informação ganhavam o mundo: [...] “Seu império congolês era tão bárbaro que a notícia se espalhou, e os protestos na Europa aumentaram. A história dos escritores e paladinos que divulgaram os horrores do Congo Belga é impressionante. Um antigo escrivão de navio chamado Edmundo Morel, que notara a disparidade entre as cargas que saíam de Antuérpia e os carregamentos que chegavam —só armas e munição saindo, só marfim e borrachas lucrativos entrando —, foi um dos principais líderes da agitação, fundando a Associação para Reforma do Congo. Morel era um “bom europeu” a ser colocado como contrapeso para Leopoldo. Outros homens famosos, como o ROMANCISTA POLONÊS-BRITÂNICO JOSEPH CONRAD (aqui está o nosso escritor!), e o nacionalista irlandês Roger Casement, também eram muito influentes, embora a tradição não conformista cristã fosse mais importante do que qualquer indivíduo isolado” A equação nefasta de Leopoldo II e seus asseclas foram os agentes do caos entre 1880 e 1920 com seus assassinatos, com a fome, a baixa taxa de natalidade, pela degradação física e por uma dezena de outros atentados contra a humanidade. Estima-se quer 10 milhões de pessoas morreram. Os congoleses, como judeus na II Guerra, não eram totalmente humanos para os belgas. De Antuérpia, partiam aventureiros, armas e munição, junto com correntes e algemas, para o Congo. O que vinha do Congo eram cargas de marfim e borracha, lucros colossais também para Leopoldo II, que começou a fanfarrear com gastos insensatos, não apenas com amantes e artigos de luxo, mas também com o aumento de seu palácio real e a edificação de conjuntos arquitetônicos para impressionar os súditos belgas. Conrad coloca na boca dos seus personagens: [...] “Eles estavam morrendo lentamente – isso era bem claro. Eles não eram inimigos, eles não eram criminosos, eles não eram nada mais na terra, além de sombras negras de doenças e fome, lançados de maneira confusa dentro de trevas esverdeadas. Trazidos de todos os recessos da costa, dentro de toda legalidade de contratos temporários, perdidos nas cercanias incompatíveis, alimentados com uma comida desconhecida, eles adoeciam, tornavam-se ineficientes e, então, lhes era permitido rastejar até ali e descansar” [...] Ele exclamou, sussurrando, para alguma imagem, para alguma visão... ele gritou por duas vezes um grito que nada mais era que um suspiro... ‘O horror! O horror!’”. PSICOLOGIA: Marlon subindo o Rio Congo pode ser lida como uma viagem ao inferno: negros africanos morrendo por exaustão e desnutrição. Sigmund Floyd, sugere que o coração das trevas pode descansar do lado de dentro, e que a viagem de Marlon o cerne do continente africano pode ser entendida como uma jornada pela psique humana. Ficamos sabendo que o coração das trevas não é apenas a selva insalubre no centro do continente africano, mas também o coração corrupto de todos aqueles que procuram derivar proveito e ganho através da exploração. BIBLIOGRAFIA MARR, Andrew. History of The World, 2012.E-ISBN 978-85-8057-840-9.Edição digital: 2015. EDITORA INTRÍNSECA LTDA.
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